Em várias partes de mundo, mobilizações sociais são realizadas para a conscientização do câncer de mama. Informações do tipo mais comum de câncer entre as mulheres são divulgadas: causas, fatores de risco, formas de prevenção, exames para diagnóstico precoce e tratamento adequado e em tempo hábil.
Enquanto nos países desenvolvidos, apesar da alta incidência, a mortalidade esteja em curva descendente, países de baixa e média renda como o Brasil, o número de casos novos e de óbitos por esta doença crescem a cada ano.
O aumento dos casos diagnosticados em estádio avançado e demora para início do tratamento podem gerar efeitos deletérios tanto para as pacientes quanto para o sistema de saúde do país. Para as pacientes, podem diminuir as chances de cura e do tempo de sobrevida, bem como, diminuir a qualidade de vida durante o tratamento. E, em razão da demora para se conseguir realizar o diagnóstico da doença, muitas pacientes de baixa renda acabam realizando exames necessários para diagnosticar o câncer na rede privada de saúde e arcam financeiramente com esses exames. É importante considerar, ainda, as consequências para o país, como o aumento de gastos devido a necessidade de tratamentos mais caros, complexos e prolongados para pacientes que poderiam ter sido diagnosticados com estadiamento nas fases iniciais da doença, além dos custos previdenciários decorrentes do prolongado afastamento dessas pacientes do trabalho.
Reconhecendo o impacto negativo desta situação, em 2012, o governo brasileiro emitiu a Lei No. 12.732/12 do Ministério da Saúde, ou a “Lei dos 60 dias”. Esta lei estabelece que o tratamento para qualquer tipo de câncer para os pacientes do sistema público de saúde deve começar no prazo de 60 dias a partir do diagnóstico definitivo.
Está disponível no site https://irhc.inca.gov.br do Ministério da Saúde, a última atualização dos dados de tempos para início do tratamento. Todas as Unidades Federativas tem pior desempenho no cumprimento da lei quando o diagnóstico é confirmado com biópsia extra-hospitalar, ou seja, quando é realizado antes da matrícula em Unidade Especializada para tratamento (um dos critérios para inserção da paciente na regulação e ser encaminhada para tratamento). Entre 2013 e 2017, o cumprimento da lei para câncer de mama no Brasil se deu, em média, em 65% dos casos (59 dias) para biópsias intra-hospitalar versus 35% (127 dias) para biópsias extra-hospitalar. E a análise ao longo do tempo, mostra o Rio de Janeiro como a Unidade Federativa com pior desempenho no país quando a biópsia foi extra-hospitalar. Infelizmente, o cumprimento da lei caiu de 17,4% (2013) para 6,4% (2017).
E existem diferenças de tempos para início de tratamento quando os casos são diagnosticados em estádio inicial, extra-hospitalar (média de 134 dias) e intra-hospitalar (média de 53 dias). E, quando são diagnosticados em estádio avançado, extra-hospitalar (média de 109 dias) e intra-hospitalar (média 50 dias).
Isto mostra que os casos diagnosticados antes de chegarem aos hospitais e os casos com estadio inicial estão sendo penalizados, pelos cuidados de saúde descoordenados e pelo déficit de vagas para tratamento cirúrgico presentes em todo Brasil, respectivamente.
O controle do câncer de mama é de responsabilidade do Estado e da Sociedade. E as Políticas Públicas vigentes no Brasil precisam ser resguardas para o bem das mulheres brasileiras. Uma lei tão importante como a “Lei dos 60 dias” precisa ser respeitada. Neste Outubro Rosa, eu espero que todos os profissionais da área da saúde e seus gestores repensem seus processos de trabalho para respeitar esta lei. E desejo que todas as mulheres brasileiras façam boas escolhas, conhecendo seus direitos e seus deveres. É tempo de, num esforço coletivo, melhorar o acesso aos cuidados em saúde mamária e, por conseguinte, salvar vidas.
Sandra Gioia
Conselheira da Fundação Laço Rosa e Vice-presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia – regional Rio de Janeiro